Não me esqueço até hoje daquela noite. Afinal, foi uma noite incomum, inusitada. A data, infelizmente, não consigo me recordar. Apenas me lembro que era uma partida valendo a classificação pra próxima fase da Libertadores de 94. O adversario? Ah, claro... o Palmeiras, um de nossos maiores rivais históricos. Bom, lembro também que era a primeira partida, e a segunda, por motivos da Copa do Mundo, se não me engano, seria disputado apenas um mês depois (pois é, já existia a falta de organização na época...). Nessa época, o Palmeiras já vinha embalado com a conquista do Campeonato Paulista e o Brasileiro de 93, (ambas em cima do Corinthians). A força da multinacional Parmalat fortalecera aquele que, até pouco tempo atrás, era um time modesto. Do outro lado, mantínhamos aquele rolo compressor de Mestre Telê. Bom, vamos voltar ao jogo. Lembro-me das pipocas que preparei, o guaraná e acima de tudo, a expectativa do jogo. Perdi a conta de quantas vezes me engasguei com a pipoca tamanho eram os frequentes ataques da equipe alvi-verde. Consegui contar em menos de dois minutos, CINCO ataques consecutivos deles. E um mais perigoso do que o outro. Era inacreditável, mas só dava ataque palmeirense no jogo. Acho que só no primeiro tempo foram mais ou menos uns trinta ataques da equipe esmeraldina. O tricolor, acho que chutou uma ou duas vezes contra a meta adversária. O placar, por incrível que pareça, terminou em 0x0 (Graças a Zetti). Começa entao, o segundo tempo. Pensei comigo mesmo: “Ah, agora o tricolor reage. É impossível o São Paulo jogar tão mal quanto o primeiro tempo...” E o pior é que eu estava enganado. Mal começa o segundo tempo e lá vem mais pressão palmeirense... Só dava o ataque dos malditos, e minha pressão cada vez mais subindo. Nessas horas, a pipoca já estavam todas esparramadas no chão, tamanho era o meu desespero frente aos constantes ataques palmeirenses. E o nosso arqueiro lá, ora fazendo defesas espetaculares, ora observando a bola explodir na trave ou no travessão, ora torcendo pra ela ir pra fora... Até que houve um momento que considero PARTICULARMENTE, a maior sequência de defesas que já vi em toda a minha vida. Só lembrando que eu vi sim, a sequencia fantástica de defesas do fenomenal Rodolfo Rodriguez. Mas essa do Zetti, pra mim, foi mais dificil ainda. Começou de um chute de longe. Zetti espalmou pro lado esquerdo. A bola no alto, sobrou na cabeça de um atacante. Foi um tiro à queima-roupa, praticamente. Zetti miraculosamente espalmou pra frente, e no rebote, defendeu um chute certeiro de outro palmeirense. Mais uma vez Zetti defende, mas pra alivio de todos nós são-paulinos (que deve ter matado todos os cardíacos), Zetti conseguiu mandar para escanteio. E o bombardeio verde não parava. Foi um verdadeiro massacre até o final do jogo. Quando estava acabando a partida, ainda tinha uma ÚLTIMA emoção guardada. Mas desta vez, era a nosso favor. Num contra-ataque rápido, Euller, o filho do vento, arrancou em direção ao gol. Dentro da pequena área, César Sampaio, agarrou e rasgou a camisa do ponteiro. Penalty escandaloso a favor do São Paulo, que foi medonhamente IGNORADO pelo árbitro da partida. Árbitro esse que, não me lembro o nome (se não estiver enganado, era Ilton José da Costa), mas lembro que era apenas um cidadão negro, alto e forte. E CEGO, também, porque o lance foi a mais ou menos três ou quatro metros dele. Acabou a partida, acabou o sufoco. Os repórteres foram correndo em disparada ao herói da partida. Pela primeira vez, vi um atleta ser votado de forma unânime em vários veículos concorrentes. Um comentarista disse: “Olha, se alguém não votar no Zetti hoje, vai estar cometendo a maior injustiça do mundo. Não tenho mais outra opção.” Entrevistaram os atacantes palmeirenses. Um repórter muito distraído, perguntou para um dos jogadores do Palmieras: “Por que o abatimento?”. O jogador, cansado e meio incrédulo respondeu: “Pergunta pro goleiro deles....” Ele é o motivo do nosso abatimento... Eu ri muito. Senti muito orgulho aquele dia. Não orgulho do time, pois afinal, se o Zetti fora o herói daquela partida, sinal de que o restante do time foi uma lástima.... Tive orgulho de ter no meu time, um goleiro que ficou marcado na história naquela noite de milagres. No dia seguinte, todos os jornais esportivos estampavam a mesma pauta: “Palmeiras 0x0 Zetti”, “Zetti Faz Milagre”, “Ataque Palmeirense Esbarra em Zetti”, “O Jogo de um time só...”, e por aí vai. Hoje, me lembrando desses fatos, agradeço ao Palmeiras de coração. Agradeço por ter desprezado e abandonado esse goleiro que mais tarde, se tornou o maior carrasco palmeirense. Agradeço por ter chutado esse goleiro que, se não fosse por esses fatos, não teriamos esse aguerrido arqueiro. Depois do argentino Poy, considero Zetti, o maior goleiro da história do São Paulo. Com todo respeito a Rogerio Ceni, Valdir Peres, Gilmar Rinaldi, que são ótimos nomes. A história pode ate esquecer. Mas eu jamais esquecerei esse dia. O dia em que um simples mortal se redimiu dentro de um Estádio de futebol. O dia, ou melhor, a noite em que brilhou a estrela de um arqueiro chamado Armelino Donizete Quagliato, palmeirense de infância, mas que hoje, com certeza, carrega o São Paulo Futebol Clube no coração, onde quer que vá.....
Arigatô, Zetti....
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